19/03/2007

Voo do Cagarro.

Recostado na borda cortava isca com a faca que sempre trago comigo, afiada como nenhuma, cortar com ela é um dos poucos prazeres a bordo da lancha do meu pai. Gosto deste lugar a meia nau, aqui pouco incomodo o meu pai na popa e o joaquim na proa, ambos com o arame arreado tacteando o fundo com uma precisão de quem tem as mãos na ponta dos anzóis... esta posição custou-me alguns anos a precisá-la, com o pé direito na antepara e o esquerdo travado na caverna, conseguem aliviar o peso no meu cu assente na serreta de fundo; raramente me lembro do cheiro a podre deste sítio, antes pelo contrário, esta posição por vezes me excita, pois faz-me lembrar-te de pernas abertas, envergonhada olhando-me com os olhos brilhando ... nunca sei se o fazes para me agradar ou porque adoras que eu te passe com a ponta da lingua na barriga das pernas ... eu adoro chupar-te ... Mas tu nunca me disseste se gostas mesmo ou se não ... aliás nunca falamos destes poucos momentos.
Há dias que quase rebento de perguntas a fazer-te, mas nunca te perguntei nenhuma, nunca sei como fazê-lo e tu? Adorava falar contigo destas coisas, acho que se falarmos seria melhor ... ou não, se calhar estragava o mistério, mas duvido que assim fosse, pois eu só de escrever neste pequeno intervalo entre cherne e isca estou corando e sinto um estranho alívio só de escrever, se te falasse tudo o que sinto quando estou contigo de certeza que me conhecias melhor e eu a ti.
Minha querida sei que tens só 16 anos mas assim que fizeres 17, estou decidido em contar ao teu pai que estou apaixonado por ti, lembras-te daquela aula em que a professora Laura nos falou da importância de escolhermos em liberdade a nossa sexualidade? Não sei se percebi tudo quanto ela nos disse mas acho que agora sei ... sinto-me livre e só invejo os cagarros voando em círculos ... tenho a certeza que tu és a mulher que eu sonho que me dá gana de apertar sem fim, espero que entendas quando digo apertar, não é te magoar, mas abraçar-te forte no meu peito. Eu hoje sei porque que é que tu não queres ir mais à escola ... mas acho que não tens mais nada a provar à tua mãe, se o meu pai me perdoar vou voltar à escola e se a professora Laura ainda lá estiver direi que tem toda a razão e o quanto pensei no que me disse.
O meu pai já me chama à atenção por estar a escrever, “paneleirices” diz ele, eu acabo sempre por ter um pouco de pena dele ... acho que perdeu alguns anos da sua vida lutando contra a sensibilidade, a mesma que sinto pois somos muito parecidos, mas comigo será diferente, gostava de partilhar com a minha companheira o que sinto por dentro e te direi um dia o que agora me apetece mandar ao mar ...
A minha mãe está sempre doente e penso que parte da sua doença é da indiferença com que eles se tratam, penso muitas vezes porque é que só me tiveram a mim, terão feito amor assim tão poucas vezes. É incrível como é que nunca vi o meu pai dar um beijo a ninguém, mentira já vi dar beijos á minha cadela, tá bem que o cão é fixe mas porra!! Ele só deve fazer amor com os chernes quando tacteia o fundo e os engana.

Tenho que cortar mais isca ...

Já estou todo fodido ... os chernes não há meio de picar e estes caralhos não param de implicar com a minha escrita, “só foste para a escola para aprender fumar droga e escreveres paneleirices”, reafirma ele constantemente, já não o posso ouvir ...

Bingo!... tudo muda na cabeça dos pescadores quando enganam o peixe, estamos a ir para terra e a pescaria rendeu 16 chernes e 4 gorazes, o dia está bem ganho, disse ao meu pai que escrevia a deus para nos ajudar, o artolas acreditou e disse-me que ia me oferecer um bloco novo em folha e uma caneta de doutor, só para evocar deus e os chernes ... Para um pescador tudo mas tudo mesmo é possível desde que faça pescar mais, nos próximos anos terá mais uma história para atarraçar a cabeça a outros tantos, e desta vez terá a reza do seu filho como assunto, dirá: ... era ele a rezar e eu a sacar ...
Coitado mal ele sabe do que escrevo, para mim fica hoje assente que se falar a verdade sobre o que penso tudo corre melhor, tudo faz mais sentido, é lógico que se pesque melhor.


Hoje é tarde e não sei porquê, mas ainda tenho este estúpido papel comigo, pior ainda! fui amostrá-lo a um amigo meu que é louco por lanchas de pesca, ele é meio esquisito mas é bom homem e convenceu-me a mostrar este texto numa revista que diz que vai sair não sei quando, ele diz que o que escrevi é muito importante e bonito, e que pode ajudar as pessoas a se libertar. Não acredito nisso mas gostava que as minhas ideias saíssem em letras de máquina e em papel de jornal como ele me prometeu ... apaguei então o teu nome e o meu para que ninguém saiba quem fala ou para quem é. Só tu meu amor o saberás, pois quando sair eu já to disse ...

Anónimo, S. Miguel 2006

1 comentário:

Anónimo disse...

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